"Nzambi a tu bane nguzu um kukaiela"

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Amilcar Cabral (Por seu companheiro, Mario de Andrade)

Lisboa, 1948: “Ele descia a Calçada da Ajuda e nós subíamos. Lembro-me perfeitamente. Vinha do curso com outros colegas, no fim de uma manhã, depois das aulas. E o companheiro Humberto Machado disse: Vou te apresentar um brilhante estudante de agronomia, meu colega, de Cabo Verde. Era assim que ele era considerado, caboverdiano, embora tivesse nascido na Guiné. Eu vi um homem de estatura média, elegante. Vestido de maneira simples, mas elegante. Ainda não estava de sobretudo porque era o mês de outubro. Com um bigode, até bem desenhado, e cabelo curto como sempre usou, muito bem penteado. Creio que repartido no lado, característica dessa época do dandismo. Havia um certo dandismo nele, sempre houve. De um homem que se apresenta bem, asseado, elegante na sua simplicidade. Assim conheci Amílcar Cabral.

Falamos, falava muito bem. Ele tinha 24 anos e eu alguns anos menos. A primeira coisa que me impressionou foi a elegância nas maneiras, no modo de tratar. O aperto de mão sempre caloroso e solidário, o prazer vivo e real de encontrar um novo estudante de outro país africano. O que, mais tarde, ele chamaria de mais um valor para a nossa terra. É assim de designava os homens. A primeira conversa foi de caráter formal, sem nos aprofundarmos muito. Depois, começamos de fato a nos freqüentar”.
E na Calçada da Ajuda, com esse encontro casual, começou a acontecer um movimento que teria profundas repercussões na história do continente africano. Aquilo que Mário de Andrade, escritor, um dos fundadores e presidente do Movimento Popular para Libertação de Angola até 1962, denominaria geração Cabral. Que reuniu um grupo de estudantes universitários das ex-colônias portuguesas na África em torno das mesmas idéias, na mesma busca para reencontrar as suas raízes nacionais. Além deles, participaram também Agostinho Neto, Presidente de Angola, Marcelino dos Santos, vice-presidente da Frente de Libertação de Moçambique e Eduardo Mondlane, fundador da FRELIMO, assassinado em Dar-es-Sallam em fevereiro de 1969.
AZEVEDO, Licínio e RODRIGUES, Maria da Paz. “Diário da Libertação: A Guiné-Bissau da Nova África”. Versus: São Paulo, 1977.

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