"Nzambi a tu bane nguzu um kukaiela"

sábado, 15 de julho de 2017


Mamphela Ramphele (1947-) foi uma mulher preta e africana, nascida em uma África do Sul dividida e oprimida por uma minoria branca e assassina, que percorreu uma longa jornada rumo a ascensão política e pela liberdade e dignidade do seu povo preto; nesta caminhada, ela atuou como ativista política, médica de grandes instituições e comunitária, acadêmica, antropóloga, chanceler de universidade, empresária, executiva, mulher de negócios e autora de livros variados. Mas não vamos falar da sua vida pós-apartheid, que a levou a ser reitora de universidade, gerente-executiva do Branco Mundial, fundadora de partido político e candidata a presidente da República, em oposição ao CNA. Vamos falar de sua juventude a na luta que travou junto com Steve Biko e Barney Pityana, no Movimento da Consciência Preta e na Organização dos Estudantes Sul Africanos. As bases da ativista e Dra. Mamphela Ramphele estavam em sua cultura ancestral e na educação que recebeu dos seus pais, Rangoato Rahab, mãe, e Pitsi Eliphaz Ramphele, pai, ambos professores de escolas públicas; que a incentivaram a estudar e nunca achar que tinha chegado ao fim. A política de violência europeia vinha de longa data na África do Sul, fato esse que se agravou com o advento da política segregacionista do apartheid, imposta pelo Partino Nacional, em 1948, um ano após o nascimento da pequena Mamphela. As cenas presenciadas por aquela criança preta, assim como a humilhação sofrida por todos os pretos, proibidos de entrar em alguns ambientes, de usar banheiros, bebedouros e de transitar livremente pelas terras ancestrais, a violência policial e os baixos salários, as terríveis condições de vida, e, principalmente, uma cena que chocou aquela jovem criança, a proibição que alguns pretos tiveram de enterrar os seus familiares em terra sagrada, ou seja, essa gama de situações foram sendo introjectadas na estrutura de pensamento da guerreira Mamphela e quando ela se viu na universidade, jovem, com ânsia de mudança, tais sentimentos afloraram e foram canalizados em ativismo político firme a nacionalista: Mamphela Ramphele foi uma pan-africanista por essência. Nesta época, assim como Steve Biko, Mamphela Ramphele cursava medicina e participava do movimento estudantil; Biko, com quem mais tarde Mamphela Ramphele iria se relacionar e ter dois filhos (Lerato e Hlumelo), rompeu com o movimento de estudantes de caráter misto (União Nacional de Estudantes Sul Africanos) e formou a Organização dos Estudantes Sul Africano, de caráter nacionalista preto e pan-africano: estudantes brancos eram proibidos de participar desse movimento; concomitantemente, Steve Biko lança as bases da consciência negra e cria o Movimento da Consciência Negra, para atuar fora da universidade e junto ao povo nas comunidades e bantustões. Mamphela, filiada a ambos os movimentos de Biko, passou a ter um papel de centralidade na difusão das ideias da consciência negra e no fomento da indignação e rebelião contra a supremacia branca que era representada pelo apartheid; pela sua inteligência e ativismo político, ela foi eleita presidente de seção da Organização dos Estudantes Sul Africano). Ela, em 1972, concluiu os estudos de medicina, se tornando médica, e consciente do dever que tinha diante dos seus irmãos de cor e origem assim como ciente da importância de ser dar uma devolutiva à comunidade, ela voltou o seu trabalho para a comunidade preta, perseguida e segregada. Exercendo a medicina e fazendo o ativismo político, um trabalho de formiguinha na tentativa de conscientizar os jovens pretos sobre a sua história, beleza e resistência, foi acusada de terrorista, apenas por portar livros julgados como subversivos e proibidos. A partir disso, banida e vigiada, proibida de se reunir com um grande número de pessoas ou integrar a qualquer tipo de organização, ela intensificou o trabalho clandestino e comunitário, fundando uma organização clandestina que tinha como objetivo difundir as ideias sobre a importância do trabalho comunitário ligado a saúde; nesse processo ela diluia a luta política, a consciência preta o nacionalismo preto. Sempre na clandestinidade, ela viajou por toda a África do Sul levando a mensagem de esperança aos jovens, chegando a sair do país para denunciar o genocídio existente em seu país e articular acordos. Na medida que a resistência ia enfraquecendo o apartheid, Mamphela Ramphel conseguiu um pouco mais de tranquilidade e, seguindo os ensinamentos dos pais, voltou a estudar, em que fez Comércio, Pós-Graduação em  Saúde Tropical e mais uma graduação em Saúde Pública; fez doutorado em Antropologia Social e passou a escrever livros sobre saúde, sociologia e politica. Com o fim da política de apartheid, Mamphela Ramphel teve uma carreira promissora dentro e fora da máquina. Sobre tudo isso, é importante estudar as nossas referências para entender quais são os nossos erros e acertos; no final da trajetória política Mamphela Ramphel esteve ligada a instituições do Estado e mesmo instituições brancas e privadas, neste ponto, cabe sim uma crítica a tal postura, pois sabe-se que a supremacia branca usa de artifícios do demônio pra seduzir e cooptar os mais rebeldes; que fiquemos atentos diante desses artifícios; seja como for, a irmã Mamphela Ramphel teve um papel importante, na década de 70 e 80, momento crítico da política racista sul-africana, momentos de desilusão e falta de perspectiva; enfim, tanto Mamphela Ramphele, quanto Steve Biko, desempenharam o papel de restituir no seio do povo, de suas comunidades, o amor-próprio, o orgulho e o sentimento de mudança, tanto naqueles jovens quanto em seus velhos pais. Tempos depois, resultado do trabalho direto do movimento de Steve Biko e Mamphela Ramphele, esses jovens derrubaram o apartheid; infelizmente, os lideres e burocratas do Congresso Nacional Africano não souberam conduzir o processo e o poder continuou nas mãos dos brancos; mas essa é outra história. Em 2004, Mamphela Ramphel foi eleita uma das 100 mulheres mais importantes da África do Sul. Que honremos e respeitemos essa nossa pan-africanista por essência: Mamphela Ramphele.


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